quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Noiva

Nos meus sonhos, seria um lugar com janelas e portas transparentes, para que pudesse contemplar toda a vista que tenho lá de fora. Uma casa, aquelas com uma vista pro mar,acho que seria pedi muito (não custa nada sonhar). Gostos? Temos diferentes. Ele adora café e eu, chá, mas ambos podem ser tomados em nossas canecas.

No quarto, uma mesinha daquelas que só servem mesmo para bater com o joelho, para eu me lembrar do meu quarto de solteira, o qual não gostaria nunca de esquecer, pois foram épocas boas. Lençóis claros como o nosso respeito, respeito esse que foi conquistado com muito amor. Eu sonho com ele me acordando, daquele jeitinho que só ele sabe. Quero muita coisa, muitos sonhos e quero muita realidade também.

Se houver problemas, podem até ser muitos, mas que possamos esmagar as dúvidas, os medos, as contas a pagar, os planos fracassados e o que mais quiser afrontar a gente. Nossa casa será lugar de grandes confusões de alegria.

E confusões e alegrias, é claro, ficam mais saborosas com filhos. Desejo logo um casal de gêmeos, porque não quero ficar gorda e deformada com duas gravidezes seguidas. Não há amor que resista anos a fio sem o tempero da atração física, não é verdade? Não que eu me importe com essa coisa de padrão de beleza, nada disso. Mas, como dizem, a propaganda é a alma do negócio!

Dinheiro? Nem muito, nem pouco. Só o suficiente para ser feliz, sem ter que pedir felicidade aos outros. Quero que tudo seja só nosso, feito por nós e usufruído por nós. Afinal, um pouco de egoísmo é necessário e nunca matou ninguém.

Quero, por fim, a eternidade. Eternidade do amor, dos singelos momentos de felicidade, de um doce olhar e da companhia dele. Porque história como a nossa, o tempo não leva. Ele eterniza.

E, assim, prometo ser fiel ao amor dele, mesmo que a morte nos separe.

Esses são os meus votos do nosso casamento.

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Re-volta

Uma mulher, não como todas as outras. Marta era singular em sua maneira de viver. Por falar em viver, Marta morava em uma rua onde quase não tinha vizinhos e o único contato que tinha era com seus pensamentos. Porém, já era acostumada a vida solitária que a consumia desde sua infância.

Ela gostava de caminhar durante a noite e, em uma de suas caminhadas, Marta sentiu o frio arrepiando seu corpo e se deu conta de que não tinha quem a aquecesse. Então ela resolveu voltar para casa e procurar uma antiga agenda com telefones e endereços de vários amigos. Mesmo assim, por mais que  houvesse muitos nomes na lista, ainda assim se sentia só. Lembrava rostos, cheiros e histórias, todos num passado tão distante que não a encorajavam a ligar. Houve época em que fora feliz? Tivera amigos? Sentira-se bem?

Embora fosse um hábito de anos, dessa vez ela não quis ligar para Teresa. Não era nem por pensar que Teresa achava muito chato ouvir as lamentações. Afinal, Teresa achava mesmo. As amizades têm dessas pequenas liberdades de expressão. Assim, Marta pegou um vestido no armário, uma sandália e resolveu que o jeito de amenizar o que sentia era indo de encontro à multidão. Depois de vestida e maquiada, ela foi à uma boate perto de casa.

Na boate, ela dançou e se libertou como nunca de suas lamentações e anseios de estar tão longe daqueles que lhe eram importantes. Até encontrou lá um tal de Antero, moço moreno dos braços fortes com quem dançou a noite inteira.

Acabou-se a música, o sol se espreitava entre as nuvens e o movimento na rua voltava lentamente. Antero, o moreno de braços fortes, também foi embora. E, Marta, voltara para casa na companhia de sua solidão. Ao retornar, percebeu que não precisava de ninguém para tornar sua vida mais interessante. 

Finalmente, ao menos por uma noite, Marta percebeu que ela se bastava. Só seus pensamentos, emoções e a vida que pulsava a seu redor. Só o que precisava era, às vezes, sair da rotina, quem sabe alguns momentos de revolta, de encontro. Era o suficiente para que sua vida se tornasse intensa da maneira Marta de ser. Não era uma revolta, mas uma re-volta, para ela.

O conto de hoje saiu no blog da Milena, mais uma integrante da nossa equipe. Ela é estudante de História e tem um blog muito interessante. Clique aqui para dar uma olhada.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Seguidores

Clarissa era uma estudante do segundo ano do Ensino Médio. Durante as horas vagas, costumava ter os passatempos de qualquer adolescente normal, leia-se, principalmente, entrar na Internet. Ela participava de todas as redes sociais que se pode imaginar. De MSN a Twitter, passando pelo clássico Orkut até os mais recentes, como o Formspring. Entretanto, os pais de Clarissa começavam a se preocupar, achando que a jovem não sabia mais a diferença entre vida real e vida virtual.

A jovem costumava virar noites em frente ao computador, estava por dentro de todas as novidades virtuais e conversava com pessoas de diversas cidades espalhadas pelo país. Entre os seus amigos mais próximos estava o Gabriel, um roqueiro que morava em uma pequena cidade no interior do estado. O rapaz sempre dizia que um dia viajaria até a capital para conhecer a jovem internauta.

Mas Clarissa não ligava para a visita, pois tinha um namorado virtual, que a observava através da câmera. Ele podia vê-la e ela não, já que o rapaz não tinha câmera. A menina adorava se exibir e criou um vínculo tão forte que passava os dias pensando somente em voltar para a frente do olhar extático da webcam.

Os dias se passaram e as férias vieram. A pele de Clarissa perdeu a cor, os cabelos encresparam e o ar do quarto, mal limpo nos espaços que ela dava à mãe, se enchia do cheiro ocre de pele e suor. As palavras na tela eram dominadoras, cada vez mais submetiam Clarissa à sua vontade. Como um oráculo, o rapaz sabia o que a menina desejava e dominava seu desejo como um jogador de baralho controla as cartas antes de distribuí-las a seus pares.

Como ela não dava muita bola para as vontades dele, aos poucos, Gabriel foi diminuindo a quantidade de cantadas e de pedidos para conhecê-la pessoalmente. Ele raramente entrava na Internet. Seus momentos na Rede se chamavam Clarissa. 

A recusa da menina em conhecê-lo fez com que ele o que era uma vontade real se tornasse virtual. Um dia ela teria que vir, pensava ele. Assim, escondido cada vez mais atrás do monitor, o desejo de ver Clarissa pessoalmente deixou de ser uma coisa única, tornou-se binário. E, embora ela fosse o 1, ele era o 0.

O conto de hoje contou com a participação de Lara (@Lara_Utzig). Ela é estudante de Letras e tem um blog muito interessante. Clique aqui para dar uma olhada.

Além disso, no começo do texto, eu lembrei de um vídeo do meu outro blog. Cique aqui para assistir Voyeur On-line. 

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

A Hora Mágica

Cíntia estava deslumbrada. Nunca achou que uma notícia pudesse ser tão boa. Após sete anos de casamento, ela finalmente engravidou. O marido já estava preocupado com coisas e problemas puramente masculinos. Afinal, quem ia jogar bola, levar à praia, falar sobre aquelas coisas que a mãe jamais poderia ouvir?

Julio, seu marido, queria entender aquele momento pelo qual esperou tanto tempo e em busca do qual aplicou suas economias, sua paciência com as crises da esposa e seu tempo livre com as incansáveis idas a especialistas. Desceu e cruzou com os vizinhos sorridentes, ganhou a Rua e caminhou até a praça para observar as crianças. Um daqueles pequenos seres cercados por cuidados exigiria dele o dobro da dedicação que já dispensava à mulher.

Ter um filho, naquele momento, implicava em perder tempo, ter disponibilidade, carinho, dinheiro e paciência; coisas que Julio parecia não estar muito disposto a oferecer. O casamento estava seguro, a vida estável, a casa era confortável e possuíam um cachorro para agitar seus dias. Para que ter um filho naquela hora?

Julio então percebeu o caminho só de ida que estava percorrendo, caberia agora a ele assumir seu papel como chefe de família. Depois do baque, o mais novo papai começou a enxergar com bons olhos a gravidez da esposa e planejou as atividades que poderia desenvolver com seu filho.

A barriga de Cíntia crescia. Num dia de consulta pré-natal, ela pediu ao marido que fosse buscá-la. Na clínica, Julio congelou a expressão ao ouvir da médica que aquela gravidez tão esperada não era verdadeira. A Dra. Célia, médica de Cíntia, descobriu que aquele era mais um caso de gravidez psicológica.